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O Olhar do Gato

O condomínio à prova de assalto ainda não foi inventado. Mas isso não é demérito porque também jamais existiu a prisão à prova de fuga. A história de Alcatraz,  presídio projetado e construído para nunca permitir a fuga de seus detentos, conta muito bem o que sucedeu na ilha da Baía de São Francisco cercada de tubarões. O objetivo da prisão à prova de fugas não foi alcançado. A fuga de três prisioneiros com vida nos anos 60  mostra como eles prepararam, por meses e nos mínimos detalhes, as muitas etapas do plano. Mostra que, até certo ponto, a ação foi facilitada pela vigilância do presídio, que não soube “pensar em tudo”, como seria de esperar numa cadeia de segurança máxima. Para quem leu a história, a falha foi pela “distração” dos guardas e da direção prisional. A troca da mobília do refeitório, substituindo mesas para até 100 detentos, por outras  para apenas quatro comensais, foi uma das razões da fuga. Essas mesas de quatro pessoas permitiram a conversa reservada e ali foi planejada a fuga de quatro presidiários – um deles morreu.  Mas houve fatores ainda mais bizarros, como  o barulho de escavação do túnel a partir das celas não ser ouvido pela carceragem. Sessões de música instrumental realizadas pelos detentos tornaram  o ruído inaudível. Ficou claro que Alcatraz não era essa bola toda em matéria de segurança. O projeto à prova de fuga fracassou.

Sessão de música no presídio de segurança máxima? Isso foi  pura “distração” de quem vigiava os detentos.  A razão sempre foi e  sempre será a “distração” e é  assim em qualquer lugar onde a vigilância seja essencial.

A Bíblia diz: ora e vigia. “O escoteiro é sempre alerta”, clama o provérbio da organização de Baden Powel.  Nenhum de nós aprende isso na escola. Não  está no currículo. Nossa educação ensina a aprender através dos livros ou de um mestre que nos mostra seus compêndios, não através de algum tipo de “leitura direta”.

Assim como a prisão de Alcatraz, o condomínio à prova de assalto ainda não existe. Mas o perigo pode ser reduzido ao mínimo. Um dos caminhos é o aparato tecnológico. Não basta. Por mais aperfeiçoado que seja, este aparato  não garante a invulnerabilidade  se não estiver presente a insubstituível ação humana. O fracasso em Alcatraz foi a falha humana. Síndicos, moradores e funcionários podem ser bem sucedidos  desde que aprendam a vigiar, primeiro a si próprios, e depois ao entorno. O tema pode ser discutido em assembléia, por quê não? Vamos aprender a vigiar, vamos aprender a “pensar em tudo”. Este “pensar em tudo”  é a parte mais nobre do planejamento.  Costumamos dizer que um país pode falhar por falta de planejamento, e isso é verdade. Mas planejar é antes de tudo um estado de alerta.   Diz o folclore dos povos antigos que, após cuidar do próprio pelo, o gato olha em uma direção – e é de lá  que vem o perigo. Precisamos acompanhar o olhar do gato? Talvez não, mas esse exemplo jocoso  dá uma noção do que precisamos entender como um verdadeiro estado de alerta.

Hubert Gebara é vice-presidente de Administração Imobiliária e Condomínios do Secovi SP e diretor da Hubert.